Brincando com fogo: padres que negam a existência do diabo?


As subjetivas afirmações deste sacerdote são contraditas pelo Evangelho, pelo Catecismo e pelos Papas

Em entrevista à agência Ecclesia, o padre jesuíta Vasco Pinto de Magalhães falou sobre o seu mais recente livro, “O Mal e o Demônio“. O presente texto não é uma resenha do livro, mas um comentário sobre alguns pontos da referida entrevista.
Nos seus “Pequenos Poemas em Prosa”, o escritor Baudelaire deu voz a um pregador que dizia o seguinte:
“Meus caros irmãos, não esqueçais nunca, quando escuteis glorificar o progresso das luzes, que a maior artimanha do diabo é de vos persuadir que ele não existe!”
Esta artimanha é tão bem engendrada que atingiu mesmo sacerdotes e bispos.
Vejamos algumas das citações da entrevista, colocadas lado a lado com as palavras do Catecismo, de alguns Papas e, principalmente, do próprio Evangelho.
Afirmação 1 – Pe. Vasco: “O demônio não é uma entidade pessoal que entra. O demônio é uma desordem, uma força desordenadora”
Catecismo: “o Mal [na petição do Pai Nosso “mas livrai-nos do Mal”] não é uma abstracção, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus.” (§2851)
Papa Paulo VI: O mal não é apenas uma deficiência, mas uma eficiência, um ser vivo, espiritual, pervertido e perversor. Terrível realidade. Misteriosa e pavorosa. Sai do quadro do ensino bíblico e eclesiástico quem se recusa a reconhecer a sua existência (…) ou quem a explica como uma pseudo-realidade, uma personificação conceptual e fantástica das causas desconhecidas das nossas desgraças. (Audiência Geral, 16 de Novembro de 1972)
Papa Francisco: “E pensar que nos queriam fazer crer que o diabo era um mito, uma figura, uma ideia do mal! Ao contrário, o diabo existe e nós devemos lutar contra ele. São Paulo recorda: é a palavra de Deus que no-lo diz! Mas parece que não estamos convencidos desta realidade”. (30 de Outubro de 2014)
Afirmação 2 – Pe. Vasco: “Mas cada vez mais a Igreja sabe que é um problema psíquico.”
Pe. Gabriele Amorth, exorcista: “Mas eu não faço exorcismo ao primeiro que passa! Antes vejo as fichas clínicas, os resultados de análises e as idas ao psiquiatra. Intervenho com as orações de libertação apenas quando a medicina não fez efeito”.
Catecismo: “O exorcismo tem por fim expulsar os demónios ou libertar do poder diabólico, e isto em virtude da autoridade espiritual que Jesus confiou à sua Igreja. Muito diferente é o caso das doenças, sobretudo psíquicas, cujo tratamento depende da ciência médica. Por isso, antes de se proceder ao exorcismo, é importante ter a certeza de que se trata duma presença diabólica e não duma doença”.
Afirmação 3 – Pe. Vasco: “Os grandes exorcistas, no fundo, nunca encontraram verdadeiramente um espírito, encontraram uma espiritualidade perturbada que precisa de ser reorganizada pelo amor”. “Os exorcismos de Jesus Cristo foi curar psicopatologias”.
Evangelho: “Mestre, eu trouxe-te o meu filho que está possesso de um espírito mudo, que, onde quer que se apodere dele, o lança por terra, e o menino espuma, range com os dentes, e fica rígido. Pedi aos Teus discípulos que o expulsassem e não puderam”. Jesus respondeu-lhes: “Ó geração incrédula! Até quando hei-de estar convosco? Até quando vos hei-de suportar? Trazei-Mo cá”. Trouxeram-Lho. Tendo visto Jesus, imediatamente o espírito o agitou com violência e, caído por terra, revolvia-se espumando. Jesus perguntou ao pai dele: “Há quanto tempo lhe sucede isto?”. Ele respondeu: “Desde a infância. O demônio tem-no lançado muitas vezes ao fogo e à água, para o matar; porém Tu, se podes alguma coisa, ajuda-nos, tem compaixão de nós”. Jesus disse-lhe: “Se podes…! Tudo é possível a quem crê”. Imediatamente o pai do menino exclamou: “Eu creio! Auxilia a minha falta de fé”. Jesus, vendo aumentar a multidão, ameaçou o espírito imundo, dizendo-lhe: “Espírito mudo e surdo, Eu te mando, sai desse menino e não voltes a entrar nele!”. Então, dando gritos e agitando-se com violência, saiu dele, e o menino ficou como morto, tanto que muitos diziam: “Está morto”. Porém, Jesus, tomando-o pela mão, levantou-o, e ele pôs-se em pé. Depois de ter entrado em casa, os Seus discípulos perguntaram-Lhe em particular: “Porque o não pudemos nós expulsar?”. Respondeu-lhes: “Esta casta de demônios não se pode expulsar senão mediante a oração e jejum” (Mc 9, 17-29).
Afirmação 4 – Pe. Vasco: “O exorcismo não tira nada lá de dentro, o exorcismo comunica paz, equilíbrio, ordem, porque não há nada a tirar – um espírito não está dentro de outro espírito (…) O espírito não tem dentro nem fora. Portanto, é uma fantasia nossa para explicar um bocadinho essa realidade”.
Evangelho: “Espírito mudo e surdo, eu te ordeno: Sai dele, e não entres mais nele.”
Evangelho: “Para isto é que o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do Diabo” (1Jo 3, 9)

Comentário

A posição do pe. Vasco é de uma assustadora ingenuidade, de grande irresponsabilidade e com consequências devastadoras. Representa, na verdade, certa tendência teológica presente há muito na Igreja. Este artigo aproveita o pretexto da entrevista, mas visa essa corrente “modernista” convencida de que a doutrina “evolui”; de que passamos por uma idade das trevas na Igreja e agora vamos chegando à “idade das luzes”.
O pe. Vasco, com a sua “hermenêutica” muito pessoal, contradiz diretamente as palavras de Cristo, a doutrina da Igreja e as palavras sucessivamente reiteradas do próprio Papa Francisco e, naturalmente, de todos os Papas anteriores.
Terminemos, lembrando as palavras do Papa São João Paulo II, pouco tempo antes de se tornar Papa:
“Hoje, estamos diante do maior combate a que a humanidade já assistiu. Não penso que a comunidade cristã o tenha compreendido totalmente. Hoje, estamos diante da luta final entre a Igreja e a Anti-Igreja, entre o Evangelho e o Anti-Evangelho”.
As palavras de um sacerdote que vai ser ouvido e lido devem ser pesadas e pensadas; a sua responsabilidade é a de ir acima de si mesmo e dos seus particulares pensamentos para transmitir fielmente a doutrina da Igreja. Aos crentes como tais não interessam as opiniões pessoais, as “hermenêuticas” superficiais de um sacerdote. Aos crentes interessa ouvir a doutrina de forma corajosa e clara, sobretudo num tempo que a Irmã Lúcia recorrentemente caracterizava  como de “desorientação diabólica”.

Um interessante adendo

O grande exorcista italiano pe. Gabriele Amorth, falecido há poucos meses, revelou que a “invocação de João Paulo II tem um efeito devastador sobre o diabo” e que “Satanás teme muitíssimo Bento XVI; as suas missas, as suas bênçãos, as suas palavras são como poderosos exorcismos”.
Você encontra diversos textos sobre o pe. Amorth e outros exorcistas nesta página do portal Aleteia em português.
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Por Pedro Sinde, em Academia.edu (23 de julho de 2017), via blog Senza Pagare

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